quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Pequena caixa de Pandora


Na soleira da porta
Largo um sem-número de indagações

Como chinelos velhos
Deixo que sejam esquecidos ao relento
Até perderem a forma que assusta

Num canto qualquer, as interrogações parecem quase inofensivas

***

É Noite de Ano Novo
Alaridos na rua, um cão que late longe
Como o saco de perguntas, este som também logo será engolido

As dúvidas murcham como pipocas frias
Que as crianças atiram umas às outras
enquanto suam o tempo nos pés velozes

As dúvidas perdem força
À semelhança de pequenos duendes
Engessados da cabeça aos pés
Inofensivos adornos de Natal, suspensos na árvore fora de época

***

Meia-noite.
Hora de passar pela soleira outra vez.
As visitas reúnem coisas, sapatos, presentes
E somem na noite

Os meus que fiquem ao relento!
Nada de tirá-los do lugar
Até que as dúvidas se dissolvam
como velhos papéis esquecidos

Sigo descalça. Nua.
Nem uma placenta para acomodar o corpo que nasce.
Meus pés não são de gesso.

Do outro lado da calçada,
Pequenos duendes atados com fios invisíveis.
Pelo menos até o próximo ano.
Até o próximo dilúvio na caixa de Pandora.